11 de julho de 2012

Puerpério: bem vindo sangue...sangue bem vindo...


por Cariny Cielo

Lá se foram nove meses do meu cisma! O nascimento, meu e do meu filho, passou como flash, num piscar de olhos. Em termos hormonais - e muitos acreditam, em termos energéticos também - o meu puerpério terminou agora, com a volta dos meus ciclos menstruais.

Menstruei orgulhosa e saudosa nove meses depois do parto e dezoito meses depois da vida se aninhar no meu útero! Orgulhosa por receber novamente os banhos de renovação que as fases dão só a nós, mulheres. E saudosa por, enfim, despedir-me daquilo que foi a verdadeira libertação da minha fêmea.

Deixo pra trás meus dias de puérpera, de corpo dedicado unicamente à cria, de simbiose profunda com o universo encantado do filho recém chegado... os dias de altos e baixos emocionais, de vazio estrógeno, de noites truncadas e apetite variante... deixo uma sombra: a que enfrentei com coragem para nascer e renascer como mãe, novamente.

Recebo o cio, a enxurrada de hormônios, o viço de mulher fêmea e não mais de mulher mãe. Que venha a beleza tão lindamente projetada pela natureza, finamente desenhada pela divina força... aquela que gera, que cria! A dona do mundo. O ciclo chega assim, dizendo-me: sejas tu, mulher, fêmea! E eu sigo, criadora e criatura...

Aquilo que ouvi a vida toda que era feio, sujo, fétido... que era para esconder, disfarçar, lamentar: meu sangue! Meus sinais, minhas fases. Presa que eu era num calabouço masculino, minha única saída era lembrar, todos os meses, que havia uma mulher ali dentro... sedenta de vida! Uma "mulher brava", diria Clarissa Pinkola.

E talvez por isso eu sempre gostei de menstruar... da cor, do cheiro, das ondas de sensações que vinham com a ovulação. Não me incomodava, não me doía, não me limitava... eu não queria esconder ou mentir... era algo muito, muito simbólico para mim. Eu ainda não sabia o que o futuro me reservava mas já sentia que esse sangue era sagrado.

Essa semana precisei responder uma pergunta bem simples sobre o nascimento do meu filho caçula: "o que mais te marcou no parto?" Que difícil dizer! No entanto, de tudo que me vinha a mente, uma coisa havia em comum: as sensações corpóreas, de maneira geral, me marcaram muito. Ver, tocar, conhecer a minha placenta. Ver, tocar, sentir o cordão umbilical. O barulho que ouvi quando a bolsa d'água estourou. O bebê mexendo dentro de mim, querendo nascer, depois coroando e enfim, escorregando quentinho pro meu colo. Aquele cheirinho de bombom no quarto que perdurou por dias.

Todas sensações de carne, osso e sangue! Dizem que a placenta é nossa 'mãe interna'. E eu fiquei impressionada em ver como é grande, corpulenta, cor de sangue enegrecido...

E, por gostar sempre tanto de tudo que pertencia à minha intimidade, eu não poderia ter vivido a jornada do nascimento de outra maneira, a não ser a minha maneira!

Tinha quer ser assim... a menina que gostava do sangue que a avó insistia em dizer que ela deveria ter asco. A menina que se olhava e se investigava onde se dizia ser imoral tocar. A menina que tinha certeza que havia mais do que aquilo que o mundo apresentava como sendo das mulheres.

Não é nosso: a dor, o fardo, o peso ou a vergonha!

Nosso é o gozo, a vida, o riso solto, a renovação e a expressão...

A natureza não foi injusta com as mulheres! Quem transformou os eventos fisiológicos femininos em dores e patologias foi o modelo patriarcal que conquistou o mundo desde séculos atrás. E isso é tão forte e pujante que nós mesmas, as maiores vítimas, perpetuamos...

Menstruação não é vergonha, nem nojo. Não é para doer! Parto não é coisa de índia, é coisa de mulher. Não é para doer! Amamentar não é coisa de pobre, é natural. Não é para doer! Envelhecer não é coisa de mulher relaxada, é a ordem natural do mundo. Não é para doer! Chorar não é perder! Sentir não é ser fraco! Dar não é espoliar-se!

O que dói não é o sangramento mensal, nem a gravidez, nem o parto, nem a menopausa... dói a mulher, por querer desesperadamente ser fêmea num mundo de falos.

Hoje eu dei mais um passo na minha jornada pela mulher que nasci para ser...

Bem vindo, sangue; dores não me servem mais!





Em nota: Difícil achar uma imagem de menstruação no google! Esta, linda, e única, que achei trouxe, de quebra, uma estória interessante: veja aqui. e divirta-se com os comentários!!!

Um comentário:

  1. Adorei o texto... eu queria entender de onde nasceu nas mulheres o nojo pelo sangue, pela menstruação. Não haveria nenhuma razão para se ter nojo por algo bem natural e sinal de saúde.

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