20 de agosto de 2013

Amamentação: É que amamentar deixou de ser a regra...

Ícone da 'Ala de Amamentação' de um shopping de uma capital do país. 
Poderia ser um bebê pendurado num peito, poderia ser um gota de leite, 
poderia ser um bebê sorridente... mas não! É uma mamadeira!!!

por Cariny Cielo


Ano passado eu respondi a pergunta "Porque eu sou ativista da amamentação?" proposta pelo Desabafo de Mãe, numa blogagem coletiva que reuniu um material muito precioso sobre o assunto.

Este ano, temos um novo mote: Porque as campanhas do governo não funcionam? Sim, porque campanhas não faltam, cartazes também e não conheço nenhuma pessoa que diz que o leite materno é ruim. "Todos aprovam e sabem dos benefícios, mas, então porque nossos filhos estão sem peito?"

E eu vim defender as campanhas (calma, eu explico!). Sim, as campanhas estão melhorando... só que ainda não vencem o que está arraigado no senso comum: ainda estamos presos à 'Era da Mamadeira". O resumo do meu post é o seguinte: levou tempo pro leite materno deixar de ser a regra e levará tempo para ele ganhar 'status quo' de normal, natural, simples, igual dormir, acordar, fazer cocô, comer... (e pra mim, só vai tá bom o negócio, quando amamentar for visto assim!)

Estamos falando de séculos onde foi moldada a cultura e a história da humanidade. Situando a amamentação como fenômeno sócio-histórico, torna-se evidente que essa prática sofreu (e sofre!) oscilações em diferentes momentos históricos e em distintos contextos sociais reafirmando-se que o ato de amamentar ou não ao peito, a despeito de possuir uma expressão no nível biológico, decorre de processos que transcendem este plano sendo histórica e culturalmente condicionado. 

Então, muita água tem que passar por debaixo da ponte, muitas atrizes têm que posar e fazer propaganda em horário nobre, muitos cartazes tem surgir para colocar o aleitamento como acessível - culturalmente - a todas! Estamos bem no meio da transição... Aliás, estamos bem no meio de várias transições: do nascimento, da criação dos filhos, da dedicação ao trabalho, do casamento, das amizades, do contato com as pessoas e do vínculo... Fomos aos extremos e agora buscamos caminhos alternativos que correspondam aos anseios que fundamentaram todos os extremos que conhecemos! Queremos o melhor dos mundos antagônicos. A segurança dos avanços da medicina + parir em casa é um desses 'o melhor'!!!!

Se o símbolo, o ícone, o chamariz de uma sala de amamentação do shopping (provavelmente um dos locais mais visitados de uma cidade) é uma mamadeira, esta é a prova de que pro inconsciente coletivo, dar leite artificial é o normal, é a regra! Quando postei a foto que ilustra este post no instagram, coloquei: "ache o erro". Muitas escreveram "tinha que ser um peitão", "tinha que ser um bebê no seio" e por aí vai. Como que alguém sentou e pensou: aqui é a sala de amamentação, faz um desenhozinho de mamadeira pra ilustrar... Porque pensou assim? Pensou assim porque mamadeira é normal... é a regra... é o símbolo... é o que está plasmado no inconsciente coletivo... na primeira dificuldade, na primeira falha, na primeira noite difícil (e todos sabem que virão muitas noites difíceis)... ali está ela! A postos! Presente do chá de bebê ou de alguma avó mais solícita...

Não foi preciso procurar muito. Numa saída de casa, andando pelo centro da cidade, eu pude observar o quanto a mamadeira - e com ela o leite artificial - está arraigada na nossa cultura. Mamadeira é sinônimo de infância, de maternidade... nas farmácias e mercados (dois comércios que mais se vê nas cidades!) encontramos gôndolas com mamadeiras fofas e inúmeras opções de leite... além de funcionárias treinadas a indicar os melhores modelos, os melhores bicos...

"Vendo lembrancinhas de chá de bebê" (de brinde vai a 
mensagem de que usar mamadeira é normal)


"Eu tenho aqui a de bico ortodôntico e uma importada com 
bico que imita o seio. Qual você prefere?" (eu prefiro o seio 
autêntico mesmo, é melhor e mais barato, vc não sabia?)

Escrevi pro shopping informando que amamentação é questão de saúde pública e que eles, tendo um ambiente de uso comum do povo, devem rever suas políticas e repensar na forma de 'ilustrar' uma sala de amamentação. Recebi como resposta:
Prezada Sra. Cariny
Agradecemos o seu contato e informamos que sua sugestão foi encaminhada para o setor responsável. Para nós as sugestões de nossos clientes é a melhor forma de aperfeiçoarmos os nossos serviços. Isso nos motiva e faz com que trabalhemos para oferecer sempre o que há de melhor.Seja sempre bem vinda.


Eu sigo na militância pra mostrar que mamadeira não é normal e que leite artificial é exceção, e não regra! E que, portanto, não deve ser promovida!!!

Sigo buscando empoderar as mulheres e fazê-las acreditar que num mundo de cifras, não é preciso gastar um centavo pra alimentar um bebê durante seis meses!!! Embora, muitas vezes, eu acabe num silêncio que me incomoda, eu, refém deste período de transição da história, sigo acreditando que é uma verdade que deve ser dita e repetida milhões de vezes, em todos os lugares, sem parar, carinhosamente, com apoio, com empatia, com rigor de leis, com incentivos multifatoriais...


Recebi um interessante estudo publicado nos Cadernos da Escola de Saúde Pública do Ceará. Está todo aqui e logo abaixo eu transcrevo uma parte bem didática sobre toda a história do aleitamento materno no Brasil e no mundo... (ATENÇÃO: é só para os leitores mais fervorosos ou praquela hora em que ficamos até de madrugada no facebook e não aparece mais status pra acompanhar). Vou logo adiantando que parece que foi - mais uma - herança nefasta dos 'brancos' sobre os índios e que o chique, na época, era ter ama de leite... hoje é ter mamadeira importada com bico que imita o seio!



O aleitamento materno deve ser situado como um fenômeno sócio-histórico, com repercussões na prática cultural e, não somente no plano biológico. Para tanto, julgamos oportuno retratá-lo em diversos períodos da história da humanidade, de modo a evidenciar os diferentes sentidos a ele atribuídos.

Os problemas relacionados à amamentação no contexto da alimentação infantil são muito antigos. Talvez o aleitamento artificial seja tão antigo quanto a história da civilização humana. Isso se evidencia pela grande quantidade de crianças abandonadas em instituições de caridade, ao longo de vários séculos e durante tempos economicamente difíceis, como já se verifica na Antiguidade. Tal fato se evidencia pelos registros de recipientes encontrados em vários sítios ao lado de corpos de lactentes em escavações arqueológicas (séc. V e VII), sugerindo que os gregos recebiam alimentos de outras fontes além do leite materno, por meio
de vasilhas de barro encontradas em tumbas de recém-nascidos àquela época. Esses achados nos
possibilitam afirmar que a substituição do aleitamento materno diretamente ao peito por outras formas de alimentação constitui uma prática muito antiga. Os mistérios e tabus relacionados ao tema, ao que parece, também datam do começo da civilização.

O Código de Hammurabi (cerca de 1800 a. C) já continha regulamentações sobre a prática do desmame, significando amamentar criança de outra mulher, sempre na forma de aluguel (amas-de-leite). Na Bíblia também é referida a prática das amasde-leite e do aleitamento materno, sendo comparada à palavra de Deus entendida como o leite genuíno: “Desejai ardentemente como crianças recém-nascidas o leite genuíno, não falsificado, para que por ele vades crescendo”(I Pedro 2;2). 

Nos tempos espartanos, a mulher, se esposa do rei, era obrigada a amamentar o filho mais velho; plebéias amamentavam todas as crianças. Plutarco relata que o segundo filho do rei Themistes foi preterido por seu irmão mais velho, somente porque ele não havia sido amamentado por sua mãe e sim por uma estranha. Hipócrates escrevendo sobre o objetivo da amamentação, declara que: “somente o leite da própria mãe é benéfico, (sendo) o de outras perigoso”.

Publicações europeias do final do período medieval e início da era moderna também exaltam a importância do aleitamento materno para a infância. No século XII, havia uma atitude de indiferença em relação à criança, retratando que a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la, pois não havia registro de nascimentos e mortes e raramente no diário da família fazia-se referência aos infantes. As crianças eram representadas por homens de tamanho reduzido, expressando o sentimento vigente de que esta se diferenciava do adulto apenas no seu tamanho e na sua força. Essa concepção predominou até o fim do século XIII, quando passaram a ser reconhecidas por sua proximidade com os anjos e o menino
Jesus cujas formas aproximavam-se da morfologia infantil. Com o advento da modernidade, essa “descoberta da infância” expande-se e torna-se particularmente significativa no final do século XVI e durante o século XVII, caracterizando um período de grande avanço na discussão de temas da primeira infância 

De 1500 a 1700, mulheres inglesas saudáveis não amamentavam seus filhos. Embora o aleitamento materno fosse reconhecido como um regulador de nova gravidez, essas mulheres preferiam dar à luz de 12 a 20 bebês, do que amamentá-los. Elas acreditavam que a amamentação espoliava seus corpos e as tornavam velhas antes do tempo, crença que parece sobreviver até os dias atuais. Com isso, o desmame era iniciado precocemente, sendo utilizados, em substituição, cereais ou massas oferecidas em colher.

Existiam, ainda, as normas médicas e religiosas que iam ao encontro desse propósito, pois proibia-se a relação sexual durante o período de amamentação,que deveria ser de 18 a 24 meses, por entenderem que isso tornaria o leite humano mais fraco e com risco de envenenamento em caso de nova gravidez. O conhecimento médico vigente também considerava que o colostro era um leite ruim e que não deveria ser oferecido à criança. A alimentação das crianças era à base de leite de animais e de um alimento chamado “panado”, feito à base de pão (farinha) e água. Àquela época, havia um dispositivo na Constituição Francesa, que visava a proteger crianças nascidas de famílias ditas indigentes: amas-de-leite não poderiam amamentar mais do que duas crianças além da própria e, cada criança deveria ter um berço, a fim de que não corresse o risco de ser levado à cama pela mãe e morresse sufocado durante o sono.

De acordo com diários de chefes de família da grande burguesia parlamentar, as mães do século XVI amamentavam seus filhos e somente no final deste século ao início do século XVII, a moda de enviar os filhos para casa de uma ama conquistou as famílias de uma maneira irreversível.

No século XVIII, o envio das crianças para casa de amas se estende por todas as camadas da sociedade urbana. Ocorre nesse período um aumento crescente de mortes infantis, associadas às doenças adquiridas pelas amas de leite. Suas enfermidades contaminavam os bebês e muitas dessas amas, com receio de que estivessem “repassando afeto” aos bebês, passaram a oferecer o leite de vaca em pequenos chifres furados (precursores das mamadeiras) porque acreditava-se “que sugando o leite, sugava-se também o caráter e as paixões de quem os amamentava”. Além disso, esse procedimento passaria a acarretar importantes riscos à saúde das crianças, pois além da oferta em um recipiente não estéril, as mulheres desconheciam a quantidade exata de água que deveria ser misturada ao leite, sem considerar o risco de contaminação dessa água”.

No Brasil, existem relatos dos séculos XVI e XVII, imprecisos e contraditórios, ao tratar dos antigos Tupinambás. Os filhos das indígenas eram amamentados durante um ano e meio e, neste período, eram transportados em pedaços de pano conhecidos por typoia ou typyia. Mesmo se as mulheres tivessem que trabalhar nas roças, não largavam seus filhos: carregavam as crianças nas costas ou encaixavam-nas nos quadris. Do mesmo modo que os animais, as índias nutriam e defendiam seus filhos de todos os perigos. Se soubessem que o bebê tinha mamado em outra mulher, não sossegavam enquanto a criança não colocasse para fora todo o leite estranho .

Esses documentos são muito valiosos quando relatam a história da influência européia sobre as sociedades indígenas, radicadas no litoral do Brasil. Havia uma cultura indígena no Brasil colonial, mas os viajantes adotavam uma visão típica da tradição cristã, estando pouco preocupados com os habitantes do Novo Mundo.

Com a chegada das caravelas, muitas doenças foram aparecendo nas tribos, contaminando os índios que não possuíam qualquer defesa orgânica. Esse fato acabou produzindo uma multidão de órfãos desamparados, o que findou por levar os jesuítas a criar instituições destinadas a abrigar legiões de indiozinhos sem pais.

No século XVII, o abandono de crianças passou a ser percebido entre a população de origem portuguesa. Ao longo do século XVIII, a população dos principais centros portuários aumentou significativamente, dobrando ou quadruplicando as modestas cifras do início do século.

Quando a razão da acolhida correspondia a um interesse meramente financeiro, a estada na residência das amas quase sempre colocava em risco a vida dos bebês, pois, aos recém-nascidos era oferecido, além do leite materno, leite in natura, acrescido de carbohidratos.

Os profissionais responsáveis pela assistência também referiam a utilização de práticas “modernas” para alimentar as crianças, como o emprego de mamadeiras de vidro e pequenos bules que tinham um bico de borracha adaptado à ponta de saída.

Muitos médicos da época, no entanto, atribuíam as doenças comuns à infância aos contatos dos instrumentos citados com os miasmas atmosféricos . Nos séculos XVII e XVIII, a sociedade brasileira admitia como fato corriqueiro a morte de bebês. Àquela época, 20 a 30% morriam antes de completar o primeiro ano de vida. Aceitavam a morte como a crença da transformação de crianças em anjos, o que contribuía para que as famílias suportassem a dor da perda e a considerassem como uma benção do céu .

Formadas dentro dessa tradição, as mulheres anunciavam a morte das crianças em verdadeiras festas, o que deixavam escandalizados os visitantes da época.Esses rituais eram marcados por antigas tradições africanas e as autoridades religiosas escandalizavam-se diante daquilo que consideravam uma grosseira deturpação dos ensinamentos cristãos. Interessante observar que a morte de crianças estava relacionada com a miséria e o aumento do número de crianças mortas na Roda (Roda dos Expostos: dispositivo bastante difundido em Portugal, a Roda consistia num cilindro que unia a rua ao interior da Casa de Misericórdia. No Brasil, apenas Salvador, Recife e Rio de Janeiro estabeleceram tais Rodas no período colonial...a Roda funcionava
dia e noite, e qualquer um, furtivamente ou não, podia deixar um pequerrucho no cilindro sem ser notado ou muito menos incomodado). 

Concomitante a essa crescente mortalidade, verificava-se a negação da maternidade entre a sociedade burguesa, através da gravidez indesejada, ou o abandono das crianças pelas mulheres escravas, por falta de condições para a criá-las. Isso levou à prática de mães mercenárias e mães escravas de aluguel, que empregavam desastrosas técnicas de alimentação artificial, levando milhares de bebês à morte. Outra prática substitutiva do aleitamento materno diretamente ao peito era a utilização de ama de leite. No entanto, a partir de 1800, o número de crianças encaminhadas às amas através da Direção Mundial das Amas-deleite declinou substancialmente.

No séc. XIX, com a implantação das faculdades e academias de medicina, surgiram vários projetos destinados a combater as altas taxas de mortalidade dos expostos. As mulheres que não podiam amamentar e que tinham recursos eram orientadas a contratar uma ama-de-leite em domicílio, fiscalizando todos os cuidados proporcionados ao bebê. Ressaltavam que “essa conduta só deveria ser adotada em casos desesperados e que a babá- uma segunda mãe - seria o personagem central da família burguesa, que logo adquire autoridade sobre a mãe ignorante. Pensava-se àquela época que o simples fato de contrariá-la, poderia azedar o leite e preferia-se calar a arriscar a saúde do bebê.

As amas-de-leite, no entanto, “simulavam ser boas mães” e, visando a conservar sua remuneração, apropriavam-se das crianças, estimulando-as a permanecer a maior parte do tempo com elas. O sistema de amas-de-leite prosperou até fins do século XIX. 

Depois disso, o aleitamento artificial, sob forma de mamadeira com leite de vaca, possibilitado pelo progresso de esterilização, viria a substituir a amamentação mercenária. (E essa cultura do leite artificial perdura até hoje)



13 de agosto de 2013

Relato: "Para o que a minha experiência servir, estarei aqui disposta a contar"

"Saudade dessa barriga de 40 semanas!"

Lembram da Lorenna? Há um mês recebi uma mensagem de uma leitora me perguntando sobre o segundo filho dela. Claro que a convidei novamente, pra trazer sua história pra nós e, mais uma vez, foi um presente! Há quem prefira não falar... mas há quem veja o tesouro que é compartilhar experiências!

Eu já me peguei pensando que não sei o que é mais bonito: se os partos e seus relatos ou as jornadas, os passos dados, as escolhas feitas pelas mulheres. Todo o trabalho interno de desenrolar fios, de conhecer-se... mais e melhor. Quando lemos um relato, ele é uma ínfima parte, só um petisco, de toda a caminhada feita na essência...  E isso é lindo, isso é o que fica. Isso é a própria vida. Depois que o relato ganha forma e vai embora, ficam os ganhos adquiridos, ficam os degraus que subimos... nesta incessante jornada rumo ao que é Eterno...

Acredito que histórias como a da Lorenna são exemplos da falta que faz o profissional humanizado, o profissional que trabalha baseado em evidências científicas. Em Rondônia somos muito carentes deste serviço. Afinal, a jornada por um nascimento respeitoso e digno é somente da mulher? É uma caminhada solitária em que o médico é mero espectador e, muitas vezes, o boicotador? Não! O médico aqui talvez tenha sido a 'mão-dada' que faltou. Foi o 'confia, eu te apoio' que não veio. Foi o 'vamos? eu vou contigo' que não teve... a parcela que cabe ao médico, a parte da conta que deveria ser paga pelo profissional de saúde, já que ele é nossa reserva de cautela. Ficam lágrimas, mas fica a vivência, fica a jornada de fé, ficam as dores e as delícias de viver o que mais importa: o Amor.

Gratidão pelo privilégio de fazer parte disto tudo e parabéns pela corajosa jornada...

<3

Quando meu mais velho estava prestes a completar 3 anos, percebemos que havia chegado a hora, vamos ter mais um bebê!! Uma coisa era certa, não iria ser como foi na primeira vez, que não escolhi nada, não lutei por nada, me deixei levar. Como se para nascer uma mãe, bastasse estar grávida e deixar vir ao mundo da forma que fosse, e tudo estaria certo!

Com 39 semanas decidi que era hora de parar, desacelerar e entrei com meu pedido de licença maternidade. Não queria ter horários para acordar, dormir, almoçar, queria deixar rolar, queria ser só do meu bebê, estava apenas à sua espera, estava entregue a ele, para qualquer hora que ele quisesse chegar eu estivesse ali, aonde deveria. Queria estar em casa, de vestido e não de calça, descalça e não de sapatos! Queria dar atenção ao meu pequeno de 4 anos, avisar quem estava chegando, brincar com ele!! Arrumei todas as coisinhas aos poucos, sem pressa, pensei em todos os meus passos, o que faria se....tudo acontecesse!!! Repassei com meu marido tudo que até aquele momento tinha aprendido, lido, me informado.

Até essas 39 semanas tinha feito tudo diferente da minha primeira gravidez (que não fiz nada!). Participei de cursos, roda materna, li livros que comprei ou peguei emprestado, estava conhecendo um mundo sobre nascimentos que mal sabia que existia. Entrava madrugada adentro lendo relatos de partos, assistindo partos, e me emocionava a cada nascimento, é um espetáculo a parte, íntimo, queria um para mim!

Nesses encontros de grávidas, conheci pessoas incríveis que já tinham passado por essas experiências, com toda dedicação esclareciam, incentivavam, derrubavam mitos que a gente cria e escuta por aí! Nas reuniões da roda materna, percebi que ainda tinha muitas dúvidas sobre aonde seria o parto, qual hospital? Aqui em Porto Velho, Rondônia, só havia um que teria uma sala para parto normal adequada, apesar de o meu médico ter falado que o parto poderia ser até no apartamento de tudo estivesse evoluindo bem. Também tem a maternidade municipal que na época visitei, e achei o máximo, porém algumas coisas fez com que eu não escolhesse ir para lá, por exemplo: só poderia ter um acompanhante, aí eu teria que escolher entre meu marido e minha mãe, e eu queria os dois, também poderia pegar o plantão de qualquer médico. Queria pelo menos garantir que o médico que estivesse comigo, me conhecesse e soubesse o que eu queria para meu parto. Então decidi que iria ser no hospital particular mesmo, com o meu médico mesmo.....mas no fundo, me sentia meio só nessa caminhada...apesar do apoio que estava recebendo, precisava de alguém que estivesse na mesma sintonia que eu, que pudesse lutar comigo!! Aí recebi uma mensagem da Elis (Doula) uma das responsáveis pela criação do Grupo Buriti que realizava a roda, disse que me acompanharia se eu quisesse: "siiimmm, quero e muito", trocamos mensagens. É diferente saber que alguém que conhece todo o processo de trabalho de parto vai estar com você, só de pensar que ela estaria comigo, não me senti mais só, tive um renovo. Sou muito agradecida pelas mensagem que trocamos, enfim eu estava acreditando em mim!!

E a semana ia se passando....minha mãe chegou! Veio para passar 20 dias só comigo! Com ela, as coisas são tão mais fáceis, mais leves! Ela é meu aconchego! Minha sogra também já tinha chegado há 1 semana, e na próxima semana meu marido entrava de férias por 20 dias, mais 10 dias de licença paternidade, tínhamos combinado assim, ele também ia se envolver, diferente como foi da primeira vez!! A minha equipe formada!!

Minha mãe e minha sogra inventavam receitas e chazinhos com pouco de canela nesse começo!!Também estavam presentes nesses dias minha avó e a sogra da minha irmã, todos na sintonia, relatos de partos não faltavam. Dona Adenir pariu 8, minha vó 7, minha mãe 3, minha sogra 2, de tudo aconteceu nesses partos, nem todos bebês sobreviveram, e dá para saber porque muitas mulheres foram desencorajadas a terem seus partos, e esse medo foi passado adiante...elas sofreram violências, manobras, e intervenções que deixaram cicatrizes até na memória delas, pela forma de relatarem o que passaram!! Muito diferente dos partos humanizados que li, e que aí sim, foram de total respeito ao nascimento e à vida!!

E aí, chegaram as 40 semanas, eu me sentia o máximo, caminhava, agachava, levantava, me exercitava, prestava atenção no que comia, não tinha inchaço nem mal estar, conversava com o bebê (o Henrique), lembrava ele que eu estava a disposição dele, pronta!

Fazia minhas orações, minhas leituras, e conversava muito com uma amiga, uma irmã, que me lembrava que o controle de todas as coisas vem lá do alto, que os anjos estavam a minha disposição... "Porque aos seus anjos dará ordem ao seu respeito, para te guardarem em todos os seus caminhos" (Salmos 91.11).

Meu coração era só sossego, e o Henrique dentro de mim era só agitação. ele mexia muito, vigorosamente, sem brincadeira, ele conseguia empurrar as coisas que estavam encostadas na minha barriga, ai que saudade disso!!!

Contei para Elis que iria numa nova consulta, acho que a última, ela me alertou que ele iria querer marcar a cesariana. Por ele marcava mesmo, e olha que dizem que ele incentivava o parto normal, de verdade, não achei isso! Quem luta por isso é só a mãe, o médico não, apesar de falarem que é o melhor!

Ele quis analisar o colo do útero, e pediu que eu prestasse atenção se o bebe estava ativo, anotasse num papelzinho quantas vezes mexia durante uma hora após cada refeição. O útero estava amolecido e fino, ou seja, estava se preparando, não estava estagnado, ótimo! Naqueles próximos dias a lua ia mudar, e ele disse: acho que desse final de semana não passa!!Levei o papelzinho para casa, e perdi as contas de quantas vezes ele mexia, mexia demais, e larguei essa história de papel para lá, eram incontáveis as mexidas, teriam que ser mais de 20 vezes por dia....ultrapassava isso nos primeiros 10 min!!Fiquei pensando se isso era realmente necessário...ahh, ele também me pediu para ir na maternidade municipal no dia do plantão dele, para verificar os batimentos do bebe num aparelho (esqueci o nome) durante um minuto...fui para não dizer que não fui, pois eu sabia e sentia q tudo estava muuuito bem!!

Já era quinta-feira, e final de semana ia mudar a lua. A Elis tinha ido viajar e deixou o número da Paula (psicóloga) também do grupo Buriti. Traz paz só de olhar para ela! Nos falamos por telefone e, qualquer coisa, eu ligaria para ela! Continuei caminhando, tomando chazinhos de canela, agora mais concentrado rsrs! Pessoas ligavam para saber do menino, e a resposta era: “ainda” na barriga!!

Aí desejei muito que algo acontecesse nesse final de semana, falei com o Henrique, falei com Deus....pedi muito!! Sexta se foi, sábado, domingo...meu coração ia ficando apertado, meu semblante triste, respirava fundo várias vezes, já não falávamos de parto, de contrações, do que fazer se....
Já se passavam 41 semanas, fui para internet, fui atrás de um relato, uma explicação, uma solução, por incrível q pareça não achava nada, podia ter ligado para alguém, mas eu e minha dificuldade de pedir ajuda!!

Fui dormir, ou tentar, fiquei pensando, chamando pelo meu filho!! Acordei na segunda, com o coração pequeno, eu tinha me preparado e lido sobre tantas coisas que poderia acontecer, mas não tinha me preparado para chegar em 42 semanas, chegar na fase de risco, segundo o médico. Desde o começo eu nem cogitei isso, pois isso ocorre com poucas mulheres, e não me coloquei nesse grupo!! Ah, como era angustiante, queria minha mãe, meu colo, oramos juntas, choramos juntas!!

Percebi que havia receio de todos, medo de complicações, o clima começou a ficar diferente...nostálgico, nem receitas novas mais elas faziam, fiquei sabendo depois que minha irmã ligou até para meu médico, mas ele não atendeu! Aquela segunda-feira não podia terminar sem alguma decisão, meu marido veio até mim, pediu para que nós fossemos no dia seguinte no médico, eu concordei. Chegando lá ele falou a possibilidade de indução, já tinha lido, e não me imaginava fazendo isso, deitada, sorinho na veia, esperando o remédio fazer efeito, e despertar meu bebe. E eu monitorada,sei lá de quanto em quanto tempo....não, para mim soava mais coisa ruim do que boa!!

Todos queriam uma resposta, então cedi... e resolvemos marcar a cesariana. Aí ele me perguntou para quando, minha vontade era dizer: daqui 1 semana, mas não queria surtar a família que esperava ansiosamente em casa. Fica para amanhã então, dia 31 de Outubro, dia das bruxas. Todos vibravam, o sorriso voltou a reinar no rosto das pessoas. Naquela noite desejei mais do que nunca a vinda do meu bebe, mas ele dormiu tranquilo e não houve nenhuma mudança. Pela manhã arrumamos as coisas, dei um cheiro profundo no meu pequeno que ficava com a vó, e disse: "volto logo, com uma surpresa para você, te amo". 
E como sempre ele responde com toda doçura e sorrindo: "eu também te amo".

Chegamos no hospital umas 9h, fomos para o apartamento, e tudo me incomodava, eu me sentia no lugar errado, me sentia traindo a mim mesma, traindo as mulheres e mães do grupo! Não disse nada a ninguém, o coração estava apertado, chorei com meu marido!! Queria que o mundo conspirasse contra aquilo, e algo desse errado, os médicos não fossem, que acabasse a energia, sei lá! Duas horas depois do combinado mais ou menos 12h, o meu médico liga falando que não achou nenhum pediatra nem anestesista, será a conspiração?!! Adiamos para 16h, olha Henrique, essa é a hora!!! Mas Henrique estava mais preocupado em mexer suas perninhas!

Fomos para o centro cirúrgico, desligaram o ar, recebi a anestesia. Estava com muito medo, e ainda meu marido não tinha entrado, achei que fosse passar mal, coloquei a mão no rosto, logo amarraram minhas mãos, putz!, o que eu poderia fazer demais?? Meu marido chegou, e respirei mais fundo, e resolvi fechar os olhos, tapar meus ouvidos para aquelas conversas absurdas diante do acontecimento, para eles tanto faz o que está tirando, um bebê, uma vesícula, um apêndice!! 

Entrei em oração, me concentrei, falei com Deus, lembrei dos anjos, eles estavam ali, me cuidando, lembrei do amor de Deus, do amor que lança fora o medo! Na mesma hora, senti a presença deles, Deus era comigo!!Nunca tinha sentido tamanha paz, eu parecia estar dormindo, eu estava nas mãos Daquele que me criou e fez brotar vida dentro de mim! E uma coisa Ele me atentou: o receba com alegria, o seu milagre!!

O mínimo que poderia fazer pelo meu filho nesse momento era demonstrar o tamanho da minha alegria pela sua chegada. Meu coração se inflou novamente...foi quando seu choro forte me fez despertar! Ele era lindo, a cara do irmão, tinha o peso e altura do irmão, só que com o narizinho achatado, pois estava bem encaixadinho. Chegou chorando, de olhos abertos, fazendo xixi e cocô! Aí o trouxeram pertinho de mim, falei baixinho com ele, os olhinhos dando aquelas piscadinhas bem lentas, ele se acalmou, prestando atenção na voz, que ele conhecia! Pedimos para que ele ficasse conosco ali, mas não deixaram, ele tinha que trocar a roupinha, que doida essa mãe!!

Daí em diante, eu era só peito, só alegria, passamos a noite, eu, Henrique e vó Pupinha em claro, o leite já tinha descido, ele já mamava, e eu me doava, foram dois meses de peitos feridos, dia sim dia não no banco de leite, foi uma luta, porém era o peito de uma mãe muito mais forte do que antes, que não estava disposta a desistir por nada. Hoje está com 9 meses e ainda mama muito!!!
O nascimento do Henrique poderia ter sido diferente sim, hoje eu creio que existiam outros caminhos e outras decisões que poderiam ser tomadas. A primeira coisa que eu faria diferente, era não comunicar a todos a famosa "Data Provável do Parto" (DPP), pois todos dão limites à gestação, o limite padrão. Porém a DPP é uma previsão retirada de uma tabela baseadas na data da última menstruação, que supõe a data da ovulação! Cada mulher é única, cada ciclo é único, e para muitas mulheres isso é irregular, então nem sempre é possível tabelar, que dirá datar o dia ideal para seu bebê nascer! Nosso corpo é muito mais inteligente que isso. O nosso costume de acreditar e confiar na suprema medicina, nos faz esquecer da singularidade do nosso corpo e de cada nascimento. Eu deveria ter confiado mais no que eu estava sentindo, que tudo estava bem, poderia esperar! Eu deveria ter recorrido a quem respeita o tempo do nascimento, e exposto minhas questões, eu sei que teriam pessoas que lutariam comigo. Mas já virei essa página, isso já não posso mudar na minha estória! Mas sei que novas mães virão, novas lutas, e muitas dúvidas, e para o que a minha experiência servir, estarei aqui disposta a contar.


Henrique com 9 meses!!



9 de agosto de 2013

Maternidade Ativa: Guia bem humorado para vencer o mau humor decorrente de cuidar da própria sujeira: PARTE I: Rol não exauriente!


Eu e o meu balde rolante: um caso de amor

por Cariny Cielo

Hoje faz um mês que estamos cuidando da nossa própria sujeira!

Não é algo que nos dê um Nobel (esse fica pro futuro), mas é algo que percebi que é recheado de conceitos e pré-conceitos. No Brasil parece ser cultural que ter alguém para cuidar da nossa sujeira é chique! E este ‘parece’ tem dados reais: o Brasil é o país numero um do mundo em empregados domésticos...

A ideia de ter alguém cuidando das minhas imundices enquanto eu trabalho e toco a vida era simplesmente absoluta e nada ao meu redor me fazia pensar que poderia ser diferente. Até que essa coisa toda de ser mãe e começar a questionar tudo (e ter um irmão mais novo pentelho que mora do exterior e me traz papos fresquinhos sobre o outro lado de muitas coisas), fez-me parar para questionar também isso: 
Péraí-páratudo! Eu fui criada dependente de terceirizar o serviço doméstico! Culturalmente moldada, entalhada e esculpida para depender de terceirização de serviços domésticos. E estou perpetuando esta ideia criando meus filhos igualmente dependentes deste modelo.

Com o pontapé inicial que partiu do macho alfa e os empurrões que recebi do meu irmão, eu comecei a desenvolver questões profundíssimas que nem valem contar aqui... 

Mentira, valem sim! Como, por exemplo:

1. O serviço doméstico ser resquício da nossa cultura escravocrata;
2. Como ser absurdo que alguém que lava nossos fundos não possa usar nosso banheiro ou dividir com a gente o elevador;
3. Que uma lei que surgiu recentemente para garantir o mínimo aos empregados domésticos foi rechaçada por muitos que eram, na verdade, exploradores de pessoas;
4. Que não é justo que uma mulher deixe sua própria casa e seus próprios filhos para cuidar da limpeza da nossa casa, perpetuando as mazelas do capitalismo;
5. Que não estou educando meus filhos para a vida, se não os coloco responsáveis pela própria sujeira, pela organização de seu próprio espaço e se os ensino que o zelo pelo próprio ambiente em que vivem depende de um terceiro;
6. E algumas outras bem pessoais que guardei para o divã... ou para um livro... enfim...

Sobre isto leia o instigante texto ‘Mucamas, Criadas ou Domésticas’ do historiador Ricardo Corrêa Peixoto (Colunista do Brasil Escola, pesquisador e estudioso da História dos Marginais, autor de diversos artigos e ensaios sobre exclusão social, transição Império-república, escravismo-capitalismo.)

Eu não estou dizendo que nunca mais precisarei de ninguém (no estilo ‘nunca mais sentirei fome nesta vida’ da Scarlet do filme ‘E o Vento Levou’). Não! Afinal, eu tenho três filhos, eu trabalho fora, eu sou preguiçosa, eu blá blá blá... 

Mas uma mudança brutal processou-se dentro de mim de forma que, quando (e se) eu tiver alguém, esse alguém virá me ajudar e não cuidar-da-minha-casa-por-mim. É uma diferença abismal! Assim como acontece com nossa babá que está no seio familiar há uns 15 anos e me ajuda a cuidar dos meus filhos... não cuida deles no meu lugar. Parece bobo? Não é não... Uma faxina é muito mais valorizada e melhor remunerada do que o vínculo trabalhista doméstico.

Depois deste importante primeiro passo, descobrimos um mundo novo! Um mundo de pessoas que cuidam da própria sujeira!!! Bingo!!! Onde tava esse povo todo pra me abrir os olhos quando eu achava legal ser patroa??? Recebi ajuda de todo lado, e ainda recebo e sinto falta de não ter dado valor às dicas da minha mãe quando ela me mandava limpar o chão... (sorry mamy!).

E nessa onda eu ouvi toda sorte de coisa! De “você enlouqueceu?” a “teu marido não vai te ajudar”, “você vai fazer tudo sozinha porque homem não gosta de limpar casa”... felizmente, aqui em casa, meu marido faz até parto (pééééééém), então, uma limpadinha de banheiro, varrer, passar pano, organizar, pra ele é fichinha! Este obstáculo machista do patriarcado nós tiramos de letra...

Na verdade o maior obstáculo à vivência “O Mundo Sem Ninguém Limpando a Casa Pra Você” é a minha total falta de jeito com a dinâmica do negócio, porém, observei que isso é algo que melhora com repetições sucessivas e aprimoramentos, no método tentativa e erro... ainda com muitos erros!

E, como eu nasci vendo graça em tudo, no que eu posso contribuir com a humanidade é criando – e a partir desta data, tornando público – o inédito, o nunca antes divulgado...

Guia bem humorado para vencer o mau humor decorrente de cuidar da própria sujeira 
PARTE I: Primeiro Decênio de Regras:


DISPENSE A TERCEIRIZAÇÃO DO SERVIÇO DOMÉSTICO E: 

Art. 1º. Descobrirás que não é preciso varrer e passar pano na casa todos os dias.
Três dias havia se passado sem a empregada doméstica e eu não via necessidade de limpar o chão. É sério, não é porquice! Eu pisava no chão e não sentia grânulos e nem havia poeira. E com esta descobri o que apelidei de ‘balde rolante’. Fiquei sabendo que o pessoal mais cool não varre e passa pano, vai logo de vassoura mágica ou esfregão com balde rolante... sim, “varrer e passar pano, varria e passava pano a sua vó”.
Nesta vibe eu também resolvi ouvir a minha mãe, ao menos uma vez nestes 34 anos, e passamos a usar o aspirador de pó. É a tarefa preferida do mais velho, de seis anos, que já a faz quase sem supervisão (atenção: não tente isso em casa).

Art. 2º. Lavar banheiro de madrugada passará a ser um divertido programa a dois.
De repente, essa coisa que cuidar da própria casa pega a gente e... em plena madrugada de sexta-feira, estamos num buteco rindo da vida estamos lavando o banheiro! Sim, qualquer hora é hora de limpar e se fazer sozinho pode ser uma penitência, fazer a dois ficará divertido... tomando vinho colonial feito no quintal da casa da vó do marido então, é pura soberba!

Art. 3º. Se o cantinho atrás do sofá estiver sujo, a culpa é só sua.
Tirando raras exceções, o dono é o mais capaz de cuidar bem do que lhe pertence. Este artigo é uma a dica preciosa para quem tinha dificuldades em encontrar alguém que limpasse bem a casa (que era o meu caso!). Veja a lógica: sua casa continua meio sujinha, mas você não está alimentando a chaga do capitalismo e está economizando um dinheiro todo mês. O mais importante é a ideia de que a responsabilidade é nossa, pelo limpo e pelo sujo, que não posso dizer “Olha a imundice aqui! A fulana limpa minha casa igual a cara dela, mas todo mês tenho que pagar direitinho senão já viu, né?”. E se estiver sujo tudo bem, a casa é sua, ninguém tem nada a ver com isto e quando você estiver a fim, você limpa (eu gosto mais desta última).

Art. 4º. Verás que tu não estás só.
Uma legião levantou-se em coro pra me apoiar. Com dicas de produtos (todos caseiros, mais baratos e que não vão corroer a sua mão) e de instrumentos (existe um mundo de vassouras, pás, escovas, buchas, panos e afins ao seu dispor). Além de uma chuva de incentivos. Você vai conseguir! Você tirará de letra! Ah, e uma liberdade! Você vai aprender a gostar! É claro que rola uns “às vezes é um saco”, mas, ótimo, eu gosto mesmo é dazamigas verdadeiras, das chapas, que me falam também do lado chato, feio, fedido das coisas pra eu poder encarar o bom e o ruim. E isso me lembra de umas gentes que eu adoro quando me vêem em algum lugar sozinha com meus três meninos e, ao invés de dizerem ‘nossa, que super mãe, que lindo, que meigo, que fofo, que cor-de-rosa’... Não! Elas me dão um olhar de verdadeira empatia, como se entendessem mesmo o que eu vivo, como se também soubessem o que é criar de verdade os filhos, botar a mão na massa, como se lessem minha mente e soltam um “nossa, que dureza, né? Mas dá de se divertir!”. Essas são das minhas!
Encontrei blogs só sobre cuidar da própria sujeira aqui, aqui e aqui. E gente que também rompeu com o sistema, sobreviveu e voltou pra contar como foi!
#tamujunto

Art. 5º. Lavar a louça não é, de todos, o pior.
Era a tarefa que eu menos gostava... ao ponto de, quando morava sozinha, meu então namorado-hoje-marido lavar o que encontrava na pia com receio de crescer alguma vida não identificada e me atacar à noite... Mas, hoje, vejo com bons olhos essa coisa de lavar copos, talheres, pratos... e passamos todos a sujar menos também. Claro, se é chato limpar, a gente cuida pra não sujar supérfluos. As crianças jogam os restinhos de comida dos pratinhos na lixeira e colocam o prato na pia. Qualquer pessoa que passa pela pia e encontra algo, já lava, pra não acumular. E assim surgiu a outra regra...

Art. 6º. Não deixarás acumular
Como a vivência “O Mundo Sem Ninguém Limpando a Casa Pra Você” ainda está em fase inicial, não posso traçar muitos comentários sobre acumular e nem sobre cumprir a risca esta regra. Mas, sim, ‘não acumular’ é uma palavra de ordem quando o assunto é cuidar da própria sujeira! Como a casa tem dois pisos (aff, se eu soubresse antes...) acabamos criando pequenas mini-centrais de limpeza com produtos e ferramentas sempre à mão, nos dois andares. Não fica muito bonito, mas e daí? A casa é minha e eu faço o que eu quiser e eu uso essa frase pra quase tudo agora! Sempre que passamos e vemos algo, já limpamos na hora ou... apenas olhamos e rimos (às vezes choramos)! Hahahaha

Art. 7º. Conhecerás teu lado chantagista.
Eu já me peguei chantageando a mim mesma, tipo: “mulher, se você não limpar este banheiro, eu te acharei a pessoa mais porca do mundo”, ou ainda, “você já passou aqui três vezes só esta manha e não limpou as prateleiras, se você não limpar, vou ligar pra sua sogra vir lhe visitar hoje e justo hoje ela irá apoiar a bolsa nesta prateleira!”. 
Até antes da vivência “O Mundo Sem Ninguém Limpando a Casa Pra Você” eu não era chantagista, nem meu cônjuge. Nós jamais praticaríamos esse ato imoral ou criminoso que consiste em ameaçar ou revelar coisas ou informações sobre uma pessoa, um grupo ou corporação a não ser que a pessoa ameaçada cumpra exigências, geralmente para proveito próprio, feitas pelo ameaçador. Até que...

Art. 8º. Aprenderás que se deve limpar sempre de cima pra baixo.
Nessa de libertar-se da dependência de terceirização do serviço doméstico, eu já fiz toda sorte de baboseiras aprendendo a limpar minha casa; mas um dia, eu me superei: limpei com esmero as prateleiras de baixo... até perceber, limpando as de cima, que a sujeira desce e suja tudo de novo. Isso vale pro teto, pras teias de aranha, pro pó que dá nos móveis... enfim. Aqui, vale um adendo: eu me considerava uma mulher inteligente, articulada, super esperta, até ser vencida pelas trapalhadas feitas, mas eu tenho me perdoado dizendo para mim mesma que não é limitação de raciocínio é só falta de prática (às vezes dá certo, e eu me convenço, às vezes não e eu me xingo: burra, burra, burra!).

Art. 9º. Necessitarás de reconhecimento imediato
Serviço doméstico é um serviço que não se vê. Só se vê quando ele não foi realizado... então, percebi que quem limpa quer ser imediatamente reconhecido pelo o grandioso feito recém realizado. É assim com quem cozinha e gosta de ouvir um sonoro ‘está delicioso!’. Notei que assim que deixei o banheiro brilhando – à custa de um vidro de vinagre (só fui aprender a economizar e dosar depois) – ninguém me elogiou, ninguém notou a belezura, mimimi. Da mesma forma, outro dia, o marido deu um grau na cozinha toda. Como eu não estava em casa e não pude ver a performance, assim que entrei em casa e passei reto sem uma palavra, ele soltou: Não vistes que limpei toda a cozinha?! Percebemos, então, que elogios e reconhecimentos devem ser adotados como moeda corrente na vivência “O Mundo Sem Ninguém Limpando a Casa Pra Você”. A boa convivência e o casamento agradecem.

Art. 10º. Limparás a casa longe da internet
Esta regra vem como colaboração de uma amiga querida. Caso você ainda não tenha notado, é impossível limpar a casa e ser popular nas redes sócias ao-mesmo-tempo-agora e, embora saibamos que muita gente consegue fazer várias coisas e ainda compartilhar tudo ao mesmo tempo com o cybermundo... isso não se aplica à faxina. 
Eu pensei até em criar tutoriais no youtube para registrar com mais detalhes toda essa nossa saga pela libertação da dependência na terceirização dos serviços domésticos, mas percebi que: ou eu assoviava ou chupava a cana!

Fiquei chupando a cana e perdi a oportunidade de ficar super famosa e dar palestras pelo país afora. Mas tô bem, tô aqui e, logo mais, nos próximos aniversários da experiência “O Mundo Sem Ninguém Limpando a Casa Pra Você”, trago outros decênios de regras.



#tadiotto&cielolaboratórios


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